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Sobre "Mayombe", Pepetela

  • Foto do escritor: Débora Pluvie
    Débora Pluvie
  • 15 de fev. de 2021
  • 3 min de leitura

Olá, pessoal.

Boa tarde. Hoje nosso resuminho do amor dará conta de um dos livros mais brilhantes da literatura angolana. Confesso que sua genialidade caminha na mesma proporção da dificuldade de leitura. Não sei se por minha ingenuidade ou falta de conhecimento quanto às guerras civis em Angola, esse livro me intrigou de tal modo a estar nas 50 primeiras páginas sem saber quem, de fato, esse Mayombe. Muito se falava e eu me perguntava: gente, que Mayombe é esse? Quem é esse cara? =/ Pois, é. A leitura avançou e descobri ali um Pepetela gênio. Vamos ao que nos importa. Segue o baile:

Em primeira análise precisamos afirmar que esta obra foi escrita nos anos 1970, mas sua publicação só aconteceu em 1980 – sendo objeto de nomeações, como o Camões em 1997, um dos mais renomados prêmios literários.

Pepetela fez parte da organização do MPLA – Movimento Pela Libertação de Angola – nação que até pouco tempo foi colônia de Portugal; e é esse contexto que será o pano de fundo do enredo de Mayombe. A narrativa conta o que acontecerá antes e durante uma das guerrilhas mais importantes que culminaram na libertação daquele país.

O livro, nesse sentido, expõe a vida de soldados revolucionários dentro de uma espécie de entidade espacial chamada Mayombe – uma floresta, o que eu só fui perceber lá pela página 50. Desse modo, pode-se pensar em mais um romance de espaço cobrado pela FUVEST, assim como O Cortiço. A floresta, então, ganha vida aos olhos do leitor.

“As árvores enormes, das quais pendiam cipós grossos como cabos, dançavam em sombras com os movimentos das chamas. Só o fumo podia libertar-se do Mayombe e subir, por entre as folhas e as lianas, dispersando-se rapidamente no alto, como água precipitada por cascata estreita que se espalha num lago.”

Um aspecto interessante a ser levado em conta na obra diz respeito ao foco da enunciação narrativa – ou seja, a voz dos sujeitos poéticos é dividida ao longo das páginas. O livro, em sua maior parte, é narrado em terceira pessoa. Entretanto, os personagens ganham voz e expõem sua visão.

“EU, O NARRADOR, SOU TEORIA

Nasci na Gabela, na terra do café. Da terra recebi a cor escura de café (...)”

“EU, O NARRADOR, SOU MILAGRE”

Nasci em Quibaxe, região kimbundo, como o Comissário e o chefe (...)”

“EU, O NARRADOR, SOU MUNDO NOVO

Recuso-me a acreditar no que diz Sem Medo (...)”

Nesse contexto, os personagens são conhecidos pelos seus ofícios ou por sua história. “Teoria”, por exemplo, é um professor e uma espécie de instrutor político do “Comissário”. Assim, tais personagens representam algo além de suas significações no enredo, mas trazem um viés político quanto à realidade em si. Mesmo após a independência de Angola, há uma guerra civil entre os grupos combatentes. Desse modo, Pepetela apresenta que dentro do próprio MPLA havia fragmentações; e consegue desvendar os perfis dos guerrilheiros que atuavam na floresta.

O foco do enredo, por outro lado, não está na história da guerra, mas nas aflições e dramas pessoais de quem ali lutava. Pode-se pensar, então, que o autor escreve uma espécie de romance pós-moderno cuja estrutura está ligada às tribulações, anseios e relações pessoais dos guerrilheiros.

“Subjetivamente... sabes? Há vezes em que um homem precisa de sofrer, precisa de saber que está a sofrer e precisa de ultrapassar o sofrimento. Para que, por quê? Às vezes, por nada. Outras vezes, por muita coisa que não sabe, não pode ou não quer explicar. Teoria sabe e pode explicar. Mas não quer, e acho que nisso ele tem razão.”

Outro aspecto a ser considerado é a participação da mulher na construção do romance – sendo Ondina a que possui maior relevância.

“As mulheres que eu amei eram de todas as tribos, desde Marrocos às Zulu da África do Sul. Todas eram belas e sabiam fazer amor, melhor umas que outras, é certo. Qual a diferença entre a mulher que esconde a face com um véu ou a que a deforma com escarificações?

Querem hoje que eu seja tribalista! De que tribo? Pergunto eu. De que tribo, seu eu sou de todas as tribos, não só de Angola, como de África?”

Ondina mostra-se consciente de seu papel na revolução histórica, social e estética de Angola. Todavia, nesse lugar, por conta do colonialismo patriarcal e extremamente conservador, a mulher foi posta como elemento secundário e ignorada em seu contexto político. A consequência, assim, foi a resistência política desse grupo. Desse modo, a voz enunciativa no romance foi uma condição negada a Ondina.

Fruto de uma experiência real, Mayombe é vivido e escrito ao mesmo tempo – o que permite que o leitor mergulhe ainda mais fundo naquele universo.

Galera, espero tenha dado uma luz aí.

Beijocas.

D.P

 
 
 

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